Convocada para treinar com a seleção brasileira em Portugal, na Missão Europa, Ana Luíza acumula conquistas e recordes importantes para o país
1 de 3 Estudante do Paranoá, Ana Luíza França é promessa da luta olímpica no Brasil
Campeã brasileira dos Jogos Escolares da Juventude, do Pan-Americano Júnior, da Copa Pat Shaw, do Campeonato Brasileiro Júnior e bronze no Mundial de Beach Wrestling são algumas das principais conquistas de Ana Luíza França, de 20 anos. Nesta semana, ela retornou de um período de treinamentos com a seleção brasileira de luta olímpica — ou wrestling, o nome em inglês — em Portugal, pela Missão Europa.
A atleta foi descoberta aos 12 anos, na escola em que estudava no Paranoá. O motivo foi inusitado: ela se metia em muitas brigas.
— Eu era uma criança com vários problemas, muito complicada, e eu já tinha sido expulsa de algumas escolas. Quando cheguei ao CEF 2 do Paranoá, por ser uma criança que estava dando bastante trabalho, por muito tempo, a escola me obrigou a praticar um esporte, por causa das brigas, das discussões. Eu nunca melhorava, nunca evoluía, sempre continuava do mesmo jeito, então me apresentaram o Professor Neto — relembra a atleta.
— Ela também teve uma ocorrência na nossa escola e a diretora me chamou e falou: “A gente precisa do seu apoio com ela, senão ela vai ter que sair daqui”. Aí eu vi o vídeo da briga dela dentro de sala de aula e exclamei: “Mas essa menina nunca fez luta?!”. A diretora respondeu que não e eu disse: “Então ela tem que treinar comigo!” — conta José Neto, treinador de luta olímpica no CEF 2 do Paranoá.
Ana Luíza começou a treinar e, logo na primeira competição nacional que participou, em 2013, subiu ao pódio: foi vice-campeã brasileira escolar, nos Jogos Escolares da Juventude, em Natal (RN). No ano seguinte, em 2014, quando a maior competição estudantil do país foi disputada em Londrina (PR), o ouro veio e ela se tornou a primeira campeã brasileira escolar do Distrito Federal na luta olímpica.
— Foi quando eu me apaixonei verdadeiramente pelo esporte. Só que, depois, por causa de alguns problemas pessoais, acabei diminuindo meu tempo de treinamento e meu foco, então os anos seguintes não foram tão bons. Mas em 2019 eu voltei com tudo! — relata a lutadora.
Os títulos se enfileiraram no ano passado: foi vice-campeã do Ladies Open, nos Estados Unidos; campeã do Campeonato Brasileiro Júnior, no Rio de Janeiro; campeã do Pan-Americano Júnior, na Guatemala; campeã da Copa Pat Shaw, também na Guatemala; bronze no Campeonato Mundial de Beach Wrestling.
— No primeiro Pan-Americano que participei, fiquei com a medalha de ouro. Fico muito feliz quando paro para pensar nisso. No ano passado, ainda pude conhecer uma modalidade nova: o beach wrestling, que é a luta olímpica de praia, na areia. Eu achei superlegal, bem interessante. E no meu primeiro campeonato de beach wrestling, fiquei em segundo lugar, o que me deu vaga para o Mundial, em que também subi ao pódio. Para fechar com chave de ouro, terminei o ano de 2019 fazendo um camp de treinamento na Finlândia — comemora Ana Luíza.
— Ela foi campeã pan-americana sem tomar nenhum ponto, um feito inédito para o Brasil. Nenhum outro atleta brasileiro conseguiu ser campeão pan-americano sem tomar nenhum ponto. Para a luta olímpica, isso é como se fosse ganhar no futebol de dez a zero — ressalta o treinador.
Neste ano, com o advento da pandemia, o Comitê Olímpico do Brasil organizou o projeto Missão Europa, que leva atletas da seleção brasileira de várias modalidades para treinarem em Portugal, onde a Covid-19 está mais controlada. No último mês, Ana Luíza foi convocada. Embarcou para Portugal em 9 de novembro, onde treinou até 6 de dezembro.
Segunda do ranking brasileiro
Atualmente, Ana Luíza França é a segunda colocada do ranking nacional na categoria 57kg, atrás apenas de Giulia Penalber, irmã do judoca da seleção brasileira Victor Penalber, que é oito anos mais velha. Somente a primeira do ranking brasileiro vai para os Jogos Olímpicos. No ranking mundial, a brasiliense ocupa a 11ª posição.
— A Ana é o Mike Tyson da luta olímpica, eu a chamo de Ana Tyson nas internas. Tenho certeza que em 2024 a gente vai estar disputando a vaga das Olimpíadas entre os melhores, pau a pau, como se diz no jargão da luta. Já em 2028 a vaga é certa, porque a Ana hoje é a número dois do Brasil na categoria dela, e a atleta que ocupa a primeira posição no ranking está adquirindo mais idade, logo logo ela vai ter outros projetos — garante José Neto.
Conhecendo o mundo através do esporte
Com a luta olímpica, a atleta do Paranoá conheceu sete países: Estados Unidos, Inglaterra, Finlândia, Estônia, Letônia, Guatemala e Portugal. Experiências que o treinador José Neto considera fundamentais para o amadurecimento da lutadora.
— À medida que fomos viajando para outros estados, outros países, ela foi convivendo com outras culturas e foi desabrochando em cima da realidade que ela vivenciava no Paranoá e no Itapoã, de briga, violência, cultura da diminuição. Ela foi percebendo que respeito, carinho, amizade ao próximo, todos os valores olímpicos que eu também coloco muito dentro do nosso tapete olímpico, eram mais positivos na vida dela. Hoje ela é exemplo, é nosso espelho de mudança. É algo que a gente pode comprovar dentro da escola: que o esporte faz a diferença — pontua Neto.
3 de 3 Ana Luíza França participou da Missão Europa com a seleção brasileira de luta olímpica, em Portugal — Foto: Arquivo Pessoal
Atualmente, Ana cursa educação física em uma universidade particular onde tem bolsa esportiva e vive em um pensionato na Asa Norte. Os treinos com o professor José Neto são diários.
— Tudo o que a gente planta a gente colhe e eu acredito que estou fazendo um bom trabalho. Vou fazer o que for preciso para conquistar minha vaga olímpica e trazer essa medalha para o Brasil, porque o wrestling brasileiro ainda não tem medalha olímpica, nem na categoria masculina, nem na feminina, nem na luta greco-romana, que também faz parte do wrestling. Então eu tenho o sonho muito grande de conseguir conquistar essa medalha para o nosso país — avalia a atleta.
Fonte: GE